Canto: a mais alta expressão

Diálogo com Dom Giussani sobre o valor do canto. Texto publicado em Litterae Communionis n. 40/ julho-agosto 1994
Renato Farina

"Não há expressão dos sentimentos humanos maior do que a música. Quem não é tocado por um concerto de cordas? Como podemos ficar insensíveis diante das cores de uma sonata para piano? Parece o máximo. Mas quando ouço a voz humana... Não sei se acontece também com vocês, mas é ainda mais, e mais do que isso não é possível. Realmente, não existe um serviço à comunidade comparável ao canto". Padre Luigi Giussani acolhe com estas palavras um grupo de pessoas para quem a música é grande parte da própria vida. Há professores de Conservatório e simples cantores amadores, todos porém emprestam fôlego, voz e paixão aos corais de Comunhão e Libertação.

A ocasião é a de um grande jantar. Aqui colocamos em ordem, a partir das anotações, as perguntas que surgiam de uma ponta à outra da grande mesa (éramos mais ou menos umas trinta pessoas) e as respostas e "contra-perguntas" de padre Giussani.
O fio condutor da conversa? A música, naturalmente; ou melhor, o canto.

Padre Giussani repete o que disse e se justifica: "Sim, o canto é a expressão mais alta do coração do homem. Não o digo porque estou na frente de vocês, que cantam. O que digo aqui, digo-o sempre".
Alguém observa: poucos por aí cantam, mas ouvimos sempre um zumbido de músicas que escapam dos fones de ouvido e surgem de todos os lados. É uma coluna sonora que nos persegue aonde quer que vamos e que nós não escolhemos. É muito comum ver multidões reunidas no karaokê ou por um cantor. "No entanto", interrompe Giussani, "estas músicas e as exibições destes fenômenos podem ser o sinal da corrupção indizível de uma época. O canto, ao invés de ser expressão de um povo, torna-se a repetição obsessiva, sentimentalóide, das incertezas e dos caprichos dos indivíduos. Talvez muitos fiquem juntos escutando e se reconhecendo naquelas notas e naqueles versos. Mas se fica em pedaços. Coletivamente sós".

Um pouco de espanto espalha-se como sal sobre a mesa. É realmente impossível um canto de povo hoje? Um dos músicos profissionais coloca a pergunta deste modo: como crescer, como ser missionários na música?
"O que mais ajuda do ponto de vista expressivo, o que faz mesmo crescer, é cantar para a comunidade. E eu sublinho a palavra para. No retiro da Fraternidade, fazer um solo não diante de, mas para dezesseis mil pessoas! Esta é a diferença entre Vasco Rossi [cantor italiano], que sem dúvida é ótimo, e vocês, que são o coral desses dezesseis mil. Vocês exprimem estes dezesseis mil, a sua consciência, vocês são a voz de um corpo, de um povo, de um destino. Vasco Rossi, mesmo diante de cem mil, exprime a si mesmo, e confirma na solidão e no vazio aqueles que mesmo assim o adoram. Ao contrário, quando vocês cantam em Rimini, no retiro, vocês nos exprimem, são nós, e a sua voz se eleva e nos toca como puro dom. Por isso o canto é gratuito, o canto é caridade. É caridade pura, o canto. Se posso dar a vocês um conselho, digo-lhes: não fiquem preocupados demais com vocês mesmos, com a capacidade que têm de se exprimir. O conteúdo da preocupação não pode ser a expressão de si, mas exprimir a consciência deste povo. Por isso, o coral, o canto, é o serviço mais útil e gratuito para a comunidade. Se uma comunidade não tem coral, quer dizer que não tem paixão, algo já se desfez".

Pergunta: e como podemos estar certos de que não estamos seguindo o nosso próprio capricho expressivo pessoal? (Convém notar que toda a conversa acontece entre um empilhar de pratos e espetar de garfos: nenhuma solenidade, somente muito apetite).
Resposta: "A certeza vem do pertencer. Esta é uma coisa muito natural. Tanto é verdade, que uma criança que não viveu a experiência deste pertencer à mãe e ao pai cresce psicopata. Canta-se, e o canto sai do peito e da garganta afirmando uma consciência, quando se pertence. Vocês nunca entraram em uma casa em que há uma jovem mãe afetuosa? É impossível que a sua criança pequena não cantarole. Canta, cantarola, tira quem sabe de onde algumas harmonias: e tem só quatro anos! É expressão da letícia [alegria] e da tranquilidade que vem do ser amados. Que vem do pertencer".

Alguém joga uma pedra: padre Giussani, é por isso que em tantos lugares, no Movimento, se canta mal?
"É sintoma da dissolução da comunidade", diz com calma padre Giussani. E se explica: "Quanto mais se enche a boca com a palavra companhia, tanto mais a comunhão se dissolveu. O pertencer à companhia, a comunhão, é substituída por uma ligação afetiva em torno de uma personalidade talvez fascinante. Mas acaba-se por ser constituídos por uma ligação psicológica. Ao contrário, a comunidade nasce da participação do Ser, de uma ontologia. Se não provém do Mistério, não é comunidade. E é preciso que haja a consciência do acontecimento, que se dá aqui e agora. Depois, quanto ao canto...". Faz-se um instante de silêncio, as colheres deixam de ser afundadas no creme de caramelo. "...Quanto ao canto: é uma carência geral do Movimento. Ela se deve ao fato de que os chefes sentem pouco o que é o homem, o que é o cristianismo? Este 'desleixo', este desamor ao canto e à música é sintoma de uma grave decadência". Ri e brinca, mas não muito: "Eu, como sei o que é o homem, exijo o canto".

É uma paixão antiga a de padre Giussani. Ele conta que em 1932-33, quando tinha 9 ou 10 anos, seu pai escolhia no jornal a que liturgia festiva iria com o filho, percorrendo toda a região da Lombardia à procura de uma missa polifônica. Eram tempos de crise; mesmo assim, mais importante do que o pão era a música. E na casa dos Giussani, em Desio, onde não havia certamente o que esbanjar, fazia-se com que viesse no domingo à noite um trio ou um quarteto para tocar Schubert.

Alguém comenta: este ser embebidos de música ou acontece ou não acontece, então. Portanto, deve se dar a ordem: "vocês devem fazer os corais, cantar"?
Padre Giussani: "Não se move ninguém com palavras. Quem pertence começa a aprender". Neste ponto volta a história do canto no Movimento. Não nasceu alguns anos depois, com Adriana Mascagni ou outros. Não nasceu nem um minuto depois do Movimento. É a mesma coisa que o Movimento; é - pode-se dizer - o seu carisma?
Giussani conta: "Na primeira missa de Gioventù Studentesca [núcleo inicial de CL], a primeira em absoluto: ali nasceu o canto do Movimento. Estávamos reunidos na igreja de São Gotardo, em Milão. E dez minutos antes da missa pus-me a ensinar Vero amore è Gesù e O côr' soave. Movi as mãos como fazia o meu professor no seminário (refaz o gesto), cantei e me acompanharam. Cinco minutos antes da primeira missa do Movimento nasceu o canto do Movimento. O início do canto do Movimento é o início do Movimento. Não há diferença. Nasce o Movimento e se canta. Como uma criança com a mãe. Pertence-se e surge o canto. Sem pertencer, não pode haver um coral. Os corais não são impostos por decreto, nascem quando nasce o Movimento: também hoje".

E as canções nascidas em GS? "Havia canções belíssimas, desde o início. E todos as cantavam. Depois, por anos e anos, estes cantos não foram mais cantados. As canções de Adriana Mascagni - belíssimas - caíram no esquecimento. Até os mais belos cantos de Claudio Chieffo (La guerra, La ballata dell'uomo vecchio, La nuova Auschwitz) tinham caído em desuso. Mas eu lutei. Se uma coisa é autêntica, você deve fazê-la continuar. E aqueles cantos voltaram".

Alguém coloca de novo o dedo na ferida, e diz: mesmo assim - e estamos no vinho final, um esplêndido rosé espumante - há quase uma surdez no Movimento... Padre Giussani comenta: "Difundiu-se uma preguiça, uma inércia... mas é sobretudo aridez. Ela domina a sociedade de hoje. Mas é precisamente com o canto que se cava neste terreno seco! Nós nos lamentamos e batemos no peito por todas as vezes em que tal aridez abriga-se em nós, e é justo. Mas pensem que nove entre dez que nos encontram e vêm às nossas reuniões vão embora dizendo: 'Como se canta bem entre vocês!'. Todos os sentimentos humanos mais fortes, o sentido do pecado, o medo, a misericórdia, os nossos aprenderam muito mais através do canto do que com as leituras. Eu aprendi essas coisas desde pequeno: não em primeiro lugar através dos sermões, mas através dos cantos. Do mesmo modo, a reforma da Igreja teve necessidade e se exprimiu através dos cantos de São Filipe Neri. Os mais belos deles vocês também cantam". E conclui: "O canto é a expressão mais autêntica do homem, se o homem é homem, e é tal se pertence. O filho, quando a mãe está perto, canta. Assim, tão logo nasce o Movimento, mesmo que seja pequeno, mesmo que seja um fragmento, ele canta".