Julián Carrón e Paola Cigarini

Salvador. Na normalidade da vida, um lugar diferente

Os 20 anos do Centro Educativo João Paulo II. Uma história feita de encontros que se renova a cada dia. Na celebração, a visita de amigos que ajudaram a recuperar o verdadeiro valor deste trabalho. E o resultado foi uma unidade impensável, e a gratidão
Isabella Alberto e Silvia Caironi

O ano de 2019 ficará marcado no Centro Educativo João Paulo II, localizado no bairro de Novos Alagados, em Salvador/BA. Foram comemorados os 20 anos da existência deste trabalho social, e para celebrar este momento foi realizada uma festa com as crianças e as famílias, e em setembro, o Centro também recebeu a visita de Julián Carrón, presidente da Fraternidade de Comunhão e Libertação, que se interessou em conhecer o trabalho, conduzido por alguns amigos seus.

Para Tamiris Conceição, coordenadora pedagógica do Centro, «celebrar os 20 anos se tornou um acontecimento, porque para construir esse momento precisamos retornar à origem: por que nasceu e como nasceu o Centro Educativo João Paulo II. E retornando à origem nos demos conta de tudo o que fez acontecer este lugar e que permite que a gente celebre 20 anos». E ela nos contou a surpresa que tiveram: «Descobrimos que essa obra nasceu de encontros, encontros como o de João Paulo II e Irmã Dulce. Quando ele esteve em Salvador em 1991, ficou sabendo da região de Novos Alagados – que era uma região que Irmã Dulce acompanhava bastante, por ter muitos carentes e necessitados –, e desejou contribuir também para a construção de uma quadra para as crianças, e anos depois essa quadra foi construída aqui no Centro Educativo. Outro encontro foi o de João Paulo II com Dom Giussani e o de Dom Giussani com amigos que ajudaram a financiar a construção deste espaço. Se este lugar existe, foi por causa destes encontros que levaram uma família a fazer uma doação. O desejo de contribuir nasceu deste encontro que os ajudou a descobrir o sentido da própria vida e fez com que desejassem ajudar tantos outros a descobri-lo também».

Paola Cigarini, coordenadora geral do Centro João Paulo II, complementa: «Para mim, o que me impactou foi que o trabalho feito pelos alunos para preparar, por exemplo, o material da mostra sobre os 20 anos, foi um trabalho de consciência dos próprios meninos e dos professores. Nós não direcionamos nada em relação ao que precisava ser dito. Simplesmente os meninos perguntaram a história, nós contamos os fatos, e tudo o que foi feito foi o resultado de como os meninos e os professores entenderam essa história comunicada. A festa foi a devolução dessa história inicial por meio de pessoas que não a viveram».

Outro fato que marcou foi a simplicidade dos meninos, que ao serem questionados sobre porque frequentavam ali, foram muito realistas. Paola conta que um deles respondeu: «"Venho porque o Centro Educativo me permite sonhar mais alto". O Centro permite ver uma outra perspectiva para suas vidas».

No dia da festa, a quadra também estava muito cheia, e muitos pais se comoveram e, não tendo conseguido falar na hora, nos dias seguintes procuravam os funcionários do Centro para agradecer.



E dentro deste contexto aconteceu também a visita de Julián Carrón. O que mais marcou Tamiris foi a Folia de Reis que os meninos apresentaram. «A Folia é uma forma de agradecer a Deus pelo ano, mas também de anunciar o nascimento do Menino Jesus. Então, receber Carrón anunciando isso foi um espetáculo, foi incrível. Cristo estava ali e nós O estávamos anunciando. Foi muito impactante. Além disso, Carrón foi de uma simplicidade incrível ao olhar para os meninos, ao falar com todo mundo, ao participar da roda de samba, e depois no diálogo com os nossos adolescentes por uns 20 minutos». Este é um grupinho de Colegiais que está nascendo, e Paola os havia provocado a fazerem suas perguntas a este amigo, porque talvez aquela pessoa que vinha pudesse responder. E eles levaram a sério e preparam 15 perguntas. «Mas eram as perguntas: ”Como eu posso saber que Deus existe se não O vejo?”; “É verdade que existe vida após a morte?”. Quando Carrón pegou o papel com as perguntas, começou a responder logo, e eu fiquei impressionada: é como se sentisse a provocação das perguntas como algo urgente e necessário como respirar, como comer, e essa imediatez me chamou muito a atenção. Assim que viram que ele começou a responder logo, os meninos se sentaram no chão e começaram a dialogar; fiquei tocada com como estavam atentos, em silêncio, prontos mesmo a escutar, e com como ele acompanhou o caminho da razão para fazê-los entender a resposta. Sinceramente, parecia Jesus com os apóstolos. É a ideia de que “este, sim, fala com autoridade, sabe o que está dizendo”. E os meninos olhando, paralisados».

Outro ponto que chamou a atenção de Paola nessa visita de Carrón foi um breve diálogo com ele, num momento de descontração, em que ele falou sobre o significado desta obra. Olhando o ambiente ao redor do Centro, a precariedade das escolas em geral, ele falava: «O valor deste lugar é uma história particular, onde acontece aquilo que pareceria impossível acontecer. Não são as regras, é a Presença. Uma história particular é feita por uma Presença».

Paola ainda afirma: «O que eu sinto como necessário, ou como fator que lhe permite se manter numa posição livre e autêntica diante da realidade que você enfrenta, também com os problemas, é o fato de você, que é responsável por uma obra, não perder o nexo com o que o gera, ou seja, uma história. Ou seja, é preciso um perímetro de amizade que diga: pão-pão, queijo-queijo. Esse vínculo com uma história maior, que é a história que o gera, eu acho que vale mais do que mil indicações práticas, porque permite que você olhe a sua realidade, que para cada um é diferente, mas sem perder esse ponto original».

E Tamiris conclui dizendo: «O que nós fazemos aqui é o normal: temos os professores, temos as aulas, temos as crianças. Mas é um lugar diferente, e às vezes eu me pego fazendo coisas, olhando para as coisas, olhando para cada menino, para cada professor também, de um jeito diferente que eu sei que eu não teria em outro lugar. E isso tem muito a ver com o lugar de que fazemos parte, e eu não posso negar que tem a ver com a experiência do Movimento».

Após estes eventos, Tamiris conta que entrou uma novidade nos trabalhos cotidianos: «Por exemplo, quem chega para trabalhar como professor aqui, com o tempo, começa a se fazer perguntas: por que a gente faz assim? por que olha assim? E a preparação da festa e da visita do Carrón foi a possibilidade de ajudar todos a entender qual é o verdadeiro significado da obra. Desta forma, hoje há um movimento pelo qual você já não precisa pedir às pessoas que façam algo, pois estão mais atentas, estão mais ligadas. Gerou-se uma unidade entre a equipe, que move e faz acontecer as coisas, é incrível. Não é nosso, não fomos nós que produzimos, e nós sabemos que isso se deu por causa desse encontro».

Por isso, a palavra que fica é gratidão. Para Paola, «por me ver como parte disso, e na medida que Deus quiser, até quando Ele quiser, por poder fazer uma experiência assim». Já para Tamiris, «o que aconteceu aqui, no meu trabalho, foi a experiência de preferência. Eu estou me sentindo assim, os meninos estão se sentindo assim. Essa novidade está introduzindo um novo caminho, também no relacionamento entre nós».